Declaração de Haia

Declaração Ministerial de Haia sobre Segurança Hídrica no Século 21

1. A água é vital para a vida e saúde das pessoas e manutenção dos ecossistemas, sendo um requisito básico para o desenvolvimento de países. Porém, no mundo todo, mulheres, homens e crianças não têm acesso à água adequada para suas necessidades básicas. Os recursos hídricos e os ecossistemas relacionados que os mantêm, estão ameaçados pela poluição, pelo uso insustentável, pelas mudanças no uso do solo e pelas mudanças climáticas, entre outras. A ligação entre estas ameaças e a pobreza é clara, pois os pobres são os primeiros a serem afetados e, com mais intensidade. Isto leva a uma simples conclusão: a solução não é a usual. Apesar da enorme diversidade de necessidades e situações em todo o mundo, há um objetivo comum: fornecer água em quantidade adequada às populações no século 21. Isto significa assegurar a proteção e melhoria da água doce, costeira e ecossistemas relacionados; promover o desenvolvimento sustentável e a estabilidade política, para que todos tenham acesso a água em qualidade e quantidade suficiente por um custo acessível para uma vida saudável e produtiva; e que as populações vulneráveis sejam protegidas de riscos e perigos relacionados à água.
2. Estas ameaças não são novas. Nem as tentativas de resolvê-las. Discussões e ações iniciadas em Mar del Plata em 1977, continuaram em Dublin e foram consolidadas no Capítulo 18 da Agenda 21 durante a Rio-92. Reafirmadas em Paris em 1998, tiveram prosseguimento durante a CSD-6, no II Fórum Mundial da Água e na Conferência Ministerial. O processo continuará, por ocasião da revisão de 10 anos da implementação da Agenda 21, em 2002, em Bonn ("Dublin + 10") e outros eventos. Estas e muitas outras reuniões internacionais têm produzido vários acordos e princípios que servem de base para a presente declaração. O objetivo de fornecer água boa para o século 21 está refletido no processo imprescindível de ampla participação e discussão entre especialistas, usuários e representantes de governo em várias regiões do mundo. Este processo tem recebido importantes contribuições do Conselho Mundial da Água, que lançou o processo da Visão Mundial da Água no I Fórum Mundial da Água em Marrakech, bem como desde a formação da Comissão Mundial da Água no século 21 e do desenvolvimento do Marco de Ação pela Global Water Partnership - GWP.

Principais Desafios
3. Para atingir a segurança hídrica, temos de enfrentar os seguintes desafios:
Satisfazer as necessidades básicas: reconhecer que o acesso à água em quantidade e qualidade e ao saneamento são necessidades humanas básicas essenciais à saúde e ao bem-estar. Proporcionar maior participação da sociedade, especialmente das mulheres, na gestão das águas.
Assegurar o fornecimento alimentar: melhorar a segurança alimentar, especialmente aos pobres e vulneráveis, através do uso mais eficiente e alocação mais equilibrada da água para a produção de alimentos.
Proteger os ecossistemas: assegurar a manutenção dos ecossistemas através de gestão sustentável dos recursos hídricos.
Compartilhar os recursos hídricos: promover a cooperação e desenvolver sinergias entre os múltiplos usos da água em bacia hidrográfica, sempre que possível, e, no caso de recursos hídricos limítrofes e transfronteiriços, entre os países envolvidos, por meio da gestão sustentável da bacia ou outras abordagens apropriadas.
Gerenciar riscos: prover segurança contra enchentes, secas, poluição e outros eventos críticos relacionados à água.
Valorar a água: gerenciar a água de forma a levar em conta seu valor econômico, social, ambiental e cultural para todos os usos, e para avançar na cobrança dos serviços de modo a refletir o custo do fornecimento. Esta abordagem deve levar em conta a necessidade da eqüidade e as necessidades básicas das populações pobres e vulneráveis.
Governar racionalmente os recursos hídricos: assegurar uma administração competente que considere o envolvimento da população e os interesses de todos os atores na gestão dos recursos hídricos.
Enfrentando os Desafios
4. Nós, Ministros e Chefes de Delegações, reconhecemos que este encontro e esta Declaração fazem parte de um processo mais abrangente, ligados a um grande espectro de iniciativas em todos os níveis. Reconhecemos o papel central que os governos desempenham na implementação de ações para enfrentar os desafios ligados à questão da água. Reconhecemos a necessidade de mudanças institucionais, tecnológicas e financeiras para superar as abordagens convencionais e, assim, enfrentar os desafios.
5. As ações aqui mencionadas baseiam-se na gestão integrada de recursos hídricos, que inclui o planejamento e a gestão dos recursos hídricos e do solo. Isto leva em conta fatores sociais, econômicos e ambientais integrando a água de superfície, subterrânea e dos ecossistemas correspondentes. Especial atenção deve ser dada às populações pobres ao papel, habilidades e necessidades das mulheres e a áreas vulneráveis tais como países situados em pequenas ilhas, países confinados e áreas desertificadas.
6. A Gestão integrada de recursos hídricos depende da colaboração e do estabelecimento de parcerias em todos os níveis, desde os cidadãos até os organismos internacionais, baseados no compromisso político, e numa ampla conscientização social, sobre a necessidade da segurança hídrica e da gestão integrada dos recursos hídricos. Para obter a gestão integrada dos recursos hídricos, são necessárias políticas coerentes em nível nacional, regional e internacional para superar a fragmentação, e poder contar com instituições transparentes e com credibilidade em todos os níveis.
7. Avançaremos no processo de colaboração de modo a transformar os princípios aprovados em ação, baseado em parcerias e sinergias entre os governos, cidadãos e outros atores. Para esse fim:
A. Estabeleceremos metas e estratégias, quando apropriado, para enfrentar os desafios na obtenção da segurança hídrica. Como parte deste esforço, nós apoiamos o desenvolvimento de indicadores de progresso ao nível nacional e sub-nacional. Para tanto, levaremos em conta o valioso trabalho realizado durante o II Fórum Mundial da Água.
B. Continuaremos apoiando o sistema das Nações Unidas para reavaliar periodicamente o estado dos recursos de água doce e ecossistemas relacionados. Do mesmo modo, assessoria será dada a países, quando apropriado, no desenvolvimento de sistemas de quantificação do avanço obtido na consecução das metas previstas cujo resultado será incluído no Relatório Mundial de Desenvolvimento da Água como parte do monitoramento global das ações preconizadas na Agenda 21.
C. Trabalharemos em conjunto com outros atores no desenvolvimento de uma sólida cultura hídrica por intermédio de uma ampla ação de conscientização. Identificaremos as melhores práticas, baseadas no aprofundamento da pesquisa e conhecimento especializados, disseminação de conhecimento por intermédio da educação e outros canais e compartilhamento do conhecimento entre indivíduos, instituições e sociedade em todos os níveis apropriados. Esta postura inclui uma coordenação em nível regional e outros de modo a promover estratégias de tratamento dos eventos críticos relacionados a água e troca de experiências quanto à reforma do setor de recursos hídricos. Nessa direção inclui-se a cooperação internacional em transferência de tecnologia e desenvolvimento institucional para países em desenvolvimento.
D. Trabalharemos em conjunto com os principais atores para aumentar a eficácia das estratégias de controle da poluição baseadas no princípio "poluídor-pagador" e para levar em conta normas e procedimentos adequados responsabilidade e compensação por danos resultantes de atividades perigosas aos recursos hídricos.
E. Diante dos antecedentes do trabalho preparatório e das discussões em Haia, trabalharemos em conjunto com as instituições multilaterais, particularmente no sistema das Nações Unidas, instituições financeiras internacionais e organismos criados por Tratados Inter-governamentais, para fortalecer políticas e programas para a melhoria da segurança hídrica, assessorando os países, quando apropriado, no enfrentamento dos desafios identificados nesta Declaração.
F. Exortamos o Secretário-Geral das Nações Unidas para avançar no sentido do fortalecimento da coordenação e coerência de ações em matéria de água no âmbito do sistema das Nações Unidas. Adotaremos posições consistentes nos órgãos de governo para imprimir maior coerência nessas ações.
G. Exortamos o Conselho do GEF a expandir as ações de seu mandato em relação aos recursos de água doce de modo a catalizar investimentos em questões relacionadas a gestão da água em nivel nacional com impacto positivo em águas internacionais.
H. Acolhemos a contribuição do Conselho Mundial da Água por intermédio da "Visão" e da Global Water Partnership - GWP com respeito ao "Marco de Ação". Acolhemos as ações de acompanhamento efetivadas por todos os principais atores numa perspectiva transparente, participativa e aberta, que envolve todos os principais grupos sociais.
I. Destacamos as declarações, em anexo feitas pelos representantes dos grupos principais e as acolhemos como uma clara reflexão da disposição de trabalhar conosco em prol de um futuro seguro em matéria de água para todos.
8. Reconhecendo que as ações mencionadas no parágrafo 7, incluindo o avanço quanto às metas e estratégias, são importantes e ambiciosas, procederemos à sua revisão periódica nos fóruns adequados, inclusive no encontro de Bonn em 2002 e na reunião de revisão dos 10 anos de implementação da Agenda 21.
9. A Conferência Ministerial reconhece a abrangência de assuntos abordados durante o 2º Fórum Mundial da Água, que foram apresentados pelo Presidente do Fórum à Conferência Ministerial. A importância destes assuntos é inquestionável; nós retornaremos a elas próximamente em fóruns relevantes no futuro e consideraremos suas implicações nas situações nacionais específicas.
10. Os desafios são enormes, mas as oportunidades também. Existem muitas experiências no mundo sobre as quais podemos nos pautar. O que é necessário, é que todos trabalhem juntos e promovam colaboração e parcerias para construir um futuro seguro e sustentável para a água. Nós nos esforçaremos, individual e coletivamente, para atingir este objetivo e nos comprometemos em estimular e facilitar as contribuições da sociedade como um todo. Reconhecemos que, com este propósito, compromissos foram adotados em Haia, (em anexo). Esta Declaração reflete a determinação de nossos governos e representa um etapa fundamental no processo de promover a segurança hídrica para todos.
11. Nós, Ministros e Chefes de Delegações, agradecemos ao governo e ao povo dos Países Baixos pela sua visão e hospitalidade em sediar esta Conferência e o Fórum.

Acordado na Quarta-feira, dia 22 de março de 2000
Em Haia, na Holanda.

Declaração feita pelo chefe da delegação Brasileira na Conferência para ser anexada à Declaração Ministerial

A delegação do Brasil reafirma a importância que o Governo Brasileiro atribui à questão dos recursos hídricos e a necessidade de fortalecer a cooperação internacional nesta área. Por este motivo é que o Brasil concorda com a adoção da Declaração Ministerial de Haia.
Porém, persistem dificuldades relacionadas ao conteúdo e conceitos contidos nos documentos "Declaração da Visão" e "Estrutura para Ação". Por isso é que o Brasil apenas toma nota desses documentos.
Diferenças na abordagem, assim como imprecisões nesses documentos, não permitem que o Brasil se associe a todas as análises, sugestões e propostas contidas nos mesmos.
Portanto, o Brasil não considera que tais documentos constituam base sólida e adequada para futuras iniciativas no âmbito das Nações Unidas ou para a definição de desafios futuros quanto ao GEF. Para tais propósitos, a Agenda 21 continua sendo reconhecida pelo Governo Brasileiro como documento único contendo diretrizes para ação da comunidade internacional, adotadas por unanimidade, sobre a questão dos recursos hídricos.

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