São
Paulo - O Fórum Brasileiro de
Mudanças Climáticas está
numa espécie de limbo. Criado em agosto
de 2000 para estudar os impactos do aquecimento
global sobre o País, para definir incentivos
fiscais a projetos de energia renovável
e para formular as propostas do Brasil em temas
polêmicos nas conferências sobre
o planeta, entre outras tarefas, o colegiado
sumiu. É difícil localizar em
Brasília quem responda sobre ele, apesar
de seu presidente ser ninguém menos que
Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente
da República.
O fórum é composto
por representantes do governo federal, Estados
e municípios, empresas, cientistas, ambientalistas
e outras organizações da sociedade,
condição que permitiu ao Brasil
despontar nas principais assembléias
mundiais como um dos líderes em questões
de desenvolvimento sustentável, aprovando
medidas como a criação dos créditos
de carbono. Mas isso foi até 2002. No
governo atual, não houve sequer uma reunião,
o que só pode ocorrer por convocação
do presidente.
O alerta sobre a extinção
do fórum foi feito em carta endereçada
ao próprio Lula, no fim de abril, pelo
então secretário-executivo do
colegiado, Fábio Feldmann. Empossado
em 2000, o ambientalista, ex-deputado tucano
e ex-secretário paulista do Meio Ambiente
esperava desde janeiro de 2003 sua substituição
por alguém indicado pelo governo petista,
mas ninguém foi nomeado para o cargo
– não-remunerado.
Feldmann
deixou o fórum. “Pedi minha exoneração
em dezembro passado e me disseram ‘fique
enquanto a gente escolhe alguém para
o seu lugar’. Em abril mandei uma carta
ao presidente pedindo novamente minha exoneração,
porque estão matando o fórum e
não tem cabimento continuar”, disse
ele.
Ninguém
sabe - Ao longo da semana passada,
o Estado procurou contatar em ministérios
e no Palácio do Planalto algum encarregado
de questões ligadas ao fórum,
mas nenhum assessor soube dizer quem seria.
O colegiado sempre esteve ligado ao Ministério
de Ciência e Tecnologia (MCT), que tem
em seu site uma área especial para ele
(www.mct.gov.br/clima/brasil/forum.htm), entretanto
a assessoria de comunicação informou
que a pasta não tem vínculo jurídico
ou administrativo com o fórum. Ninguém
fala sobre o assunto.
A busca envolveu o Ministério
do Meio Ambiente e até a Casa Civil,
também sem resultado. Por último,
a Secretaria de Comunicação do
Planalto foi mobilizada para localizar alguém
do governo que saiba do fórum, mas não
houve resposta até a noite de sexta-feira.
A
pouca ou nenhuma importância dada ao fórum
e sua “extinção na prática”
é a principal acusação
do ex-secretário-executivo. A maior preocupação
de Feldmann, porém, é que isso
representaria a “falta de noção
do governo sobre a urgência do tema”
das mudanças climáticas. “É
o principal tema no mundo, depois do terrorismo,
e o Brasil tem muito com o que se preocupar
depois do ciclone Catarina”, apontou,
referindo-se ao fenômeno que foi classificado
como o primeiro furacão a atingir o Sul
do Brasil, em março, deixando vítimas
e muitos prejuízos.
Sem a sociedade - As câmaras
temáticas do fórum iniciaram estudos,
por exemplo, sobre o impacto das mudanças
climáticas sobre os recursos hídricos
no País e sobre a regulamentação
jurídica do Mecanismo de Desenvolvimento
Limpo (MDL) – o sistema de cotas de emissão
de poluentes trocadas por financiamento a projetos
de preservação ambiental –
no Brasil. “Há questões
importantes a serem definidas: os projetos do
MDL terão uma taxa de retorno maior ou
menor se o incentivo fiscal for sobre o ICMS
ou sobre outro tributo”, citou Feldmann.
E estas questões, lembrou
ele, não podem ser definidas sem a participação
ativa da sociedade, dos empresários e
das organizações civis, além
do governo. “O governo não pode
decidir sozinho essas coisas, e o fórum
era a única instância onde havia
equilíbrio e representatividade.”
Segundo
o ex-secretário-executivo, a falta de
definições, com a desarticulação
do fórum, começa a criar problemas
com interlocutores internacionais e mesmo com
investidores. “O investidor que pode escolher
entre Brasil, Índia e China vai optar
por aquele país que tem políticas
claras de incentivos fiscais para projetos vinculados
ao MDL.”
Liderança e defensiva -
A composição pluralista e representativa
do fórum, segundo Feldmann, também
deu cacife a Fernando Henrique Cardoso para
colocar o Brasil como protagonista das soluções
para os desafios ambientais do planeta. “Agora,
o governo está sozinho, sem a sociedade,
e vem perdendo o protagonismo”, alertou.
“O governo está
assumindo uma posição defensiva,
como a que vimos em Bonn, neste mês, com
a ministra de Minas e Energia (Dilma Rousseff)
tentando justificar a inclusão das hidrelétricas
entre os projetos de energia renovável.”
A posição da ministra foi duramente
criticada por organizações internacionais.
O
fórum se reunia com o presidente, lembra
Feldmann, antes de todo evento internacional
importante. E era o presidente quem falava sobre
o tema. “Nos Estados Unidos, quem fala
sobre mudanças climáticas é
(o presidente George W.) Bush, e não
um ministro; no Reino Unido, é (Tony)
Blair; no Brasil, isso deixou de ser assunto
no governo”, criticou. David Moisés